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Especialistas alertam para riscos no tratamento da obesidade fora de clínicas especializadas e aumento de ações na Justiça

Publicada em: 08/07/2025 07:06 - Brasil

Foto: Reprodução Agência Gov

Pessoas acometidas com obesidade têm enfrentado dificuldades no acesso para tratamentos de combate à doença, que atinge um a cada três brasileiros aproximadamente. Isso porque planos de saúde estão encaminhando os usuários para estabelecimentos que não são especializados na enfermidade, causando judicialização de alguns casos, já que pacientes procuram a Justiça para conseguirem ajuda em locais indicados e de referência. 

 

Na Bahia, um caso recente chamou atenção de profissionais de saúde. Uma paciente de Salvador denunciou uma ação irregular do plano de saúde Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil (Cassi) na indicação de uma clínica para o tratamento da obesidade. 

 

Após ter seu pedido de cobertura para tratamento de obesidade mórbida em uma clínica especializada negado, a mulher entrou com uma ação judicial para conseguir autorização e realizar o procedimento de saúde. 

 

A ação foi deferida pela Justiça, que determinou ao plano a internação imediata da paciente. Em janeiro deste ano, a magistrada Lizianni de Cerqueira Monteiro estabeleceu que o plano autorizasse o tratamento e custeasse  a “internação da autora em clínica especializada para tratamento da obesidade, conforme prescrição médica, preferencialmente em rede credenciada, e se não houver, em clínica indicada pela paciente, no prazo de 5 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00."

 

No entanto, o plano, ao cumprir a ordem judicial, encaminhou a paciente a uma clínica que não seria especializada em obesidade, mas sim da área geriátrica, de cuidados paliativos e reabilitação. O caso ainda foi agravado porque a paciente tinha um quadro de transtornos psiquiátricos. Por isso, questões como comodidade, conforto, segurança, interação e convivência de paciente com outras pessoas foram alegadas por sua defesa durante o processo, apontando os prejuízos de interná-la em um local que não seria o ideal para o tratamento. 

 

Ao se compadecer com a situação, a juíza estabeleceu que a paciente realizasse o tratamento em um espaço adequado e especializado na doença, e que, já que o plano não havia indicado o suporte adequado, seria considerada a clínica sugerida pela própria paciente.

 

Episódios semelhantes a esses registraram crescimento e preocupam especialistas da área de saúde e de justiça. O presidente da Associação Brasileira de Estudos para a Obesidade e da Federação Latino-Americana de Obesidade, Fábio Trujilho, revelou ao Bahia Notícias que têm ocorrido ocorrências do tipo por todo o país, porque muitas clínicas não estão preparadas para o cuidado adequado. 

 

“Tem acontecido. Acho que a maioria dos lugares não está preparada para receber pessoa com grande obesidade. Se você fizer uma visita a muitas clínicas, é possível encontrar cadeiras apertadas, balança que não passa de 200 kg, falta de aparelhos de medir pressão específicos... Vejo que muitos lugares não têm tudo isso. Até a interpretação de exames complementares, a depender do índice de massa corpórea da pessoa, é vista de forma diferente. Então, é necessário ter uma equipe treinada”, detalhou Trujilho.

 

O endocrinologista apontou ainda acerca dos cuidados necessários e da preparação que as unidades de saúde precisam ter. 

 

“Uma clínica ou um hospital precisa oferecer uma equipe treinada. Não sei se clínica de reabilitação e de pessoas que estão em uma fase mais final de vida têm uma equipe treinada para tratar obesidade. Isso é uma questão até do juiz entender e não uma questão médica. Tem médico que sabe tratar a obesidade, tem um fisioterapeuta que sabe trabalhar a pessoa com obesidade, tem um protocolo, uma estrutura pra isso. Não sei se algumas clínicas têm separado um lugar e treinando pessoas para isso, a gente não sabe”, afirmou. 

 

O médico comentou também sobre a importância dos equipamentos hospitalares possuírem uma estrutura física, com acessórios preparados para pacientes obesos. 

 

“É preciso ter um espaço físico adequado. E isso começa pelo estacionamento, por uma rampa, pelo tamanho dos elevadores e por quanto esse elevador comporta. Por exemplo, o banheiro tem que estar preparado para receber uma pessoa com mais de 200 kg, senão vai quebrar o vaso, o tamanho do banheiro [...]. As poltronas precisam ter uma resistência grande”, observou Fábio.

 

JUDICIALIZAÇÕES
O Bahia Notícias conversou com Fabiana Prates, advogada especialista em Direito da Empresa e da Economia, para explicar a participação do Judiciário em casos assim. Segundo a advogada, a Justiça tem se mostrado sensível às demandas de consumidores contra planos de saúde, reconhecendo práticas abusivas e negativas indevidas de cobertura. Segundo ela, os juízes têm entendido que as operadoras priorizam frequentemente a lucratividade em detrimento dos direitos dos pacientes. 

 

Há uma percepção clara, segundo a advogada, de que as negativas reiteradas de tratamentos necessários violam os contratos e prejudicam os usuários, especialmente em um contexto em que a medicina avança, mas as operadoras resistem a cobrir novos procedimentos. “O Judiciário vem percebendo que o consumidor sai sim prejudicado e que há, até pela força que tem um plano de saúde, uma necessidade de fazer uma equivalência e proteger o consumidor”, explicou.

 

A postura do Judiciário baiano tem sido a de equilibrar a relação desigual entre consumidores e planos de saúde, assegurando que os direitos dos pacientes prevaleçam. No entanto, os magistrados também estão atentos para evitar fraudes ou abusos por parte dos próprios consumidores. “Há uma visão clara de que o consumidor é reiteradamente lesado em seu direito para o plano de saúde, pelo próprio plano de saúde que realmente cria uma série de empecilhos, mas também há uma preocupação do Judiciário em não permitir abusos”, alertou.

 

De acordo com Fabiana, apesar da morosidade, há uma tendência de celeridade nesses casos, com decisões que frequentemente obrigam as operadoras a cumprir suas obrigações, inclusive sob ameaça de multas por descumprimento.

 

Além disso, a advogada explicou que para os consumidores que buscam judicializar demandas relacionadas a planos de saúde, a documentação adequada é essencial. Segundo ela, é necessário ter em mãos um laudo médico detalhado, que justifique a urgência e a necessidade do tratamento, comprovantes de pagamento em dia dos últimos seis meses e, sobretudo, a negativa formal por escrito do plano de saúde. Muitos pacientes chegam ao Judiciário com base em suposições, mas a ação só poderá ser movida com a comprovação da recusa efetiva.


Por Bahia Notícias

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