Reportagem publicada originalmente no Jornal da Metropole em 4 de agosto de 2022

Imagine que você está no transporte público, indo para o trabalho e se depara com alguém infectado - e que tem conhecimento disso - com varíola dos macacos sem o menor cuidado em evitar a transmissão. Isso aconteceu com o médico espanhol Arturo Henriques, no metrô de Madri. Seu relato viralizou nas redes sociais, no último sábado, e foi noticiado em diversos veículos.

Henriques conta ter confirmado com o indivíduo que ele estava infectado. Na mesma ocasião, o médico se virou para uma passageira que estava próxima e questionou se ela não sentia medo de se contaminar com a doença. Prontamente, a mulher disse não temer, pois não era homossexual. “O governo disse que eram os gays que tinham que se cuidar”, afirmou.

A relação entre a varíola dos macacos e o alto índice de homens que fazem sexo com homens infectados tem servido de munição para a desinformação. Em entrevista à Rádio Metropole, a infectologista Ceuci Nunes alertou para o risco da doença servir como gatilho para despertar comentários preconceituosos contra homens gays e bissexuais. 

"Não podemos errar novamente como erramos no HIV/Aids, que foi chamada de ‘praga gay’. Todo mundo é suscetível. Todo mundo pode ter a varíola dos macacos. A gente não pode trazer com isso o preconceito que essas pessoas sofrem", afirmou a médica, que ressaltou também que a transmissão sexual ainda está sendo estudada.

O tema também foi abordado no programa Melhor de 3, exibido às quintas-feiras, na Metropole. Especialistas ouvidos no programa reforçaram que a varíola dos macacos é transmitida, principalmente, pelo contato. Segundo o Ministério da Saúde, esse contato pode ser direto, pelo toque com a pele e secreções, ou indireto, através de objetos contaminados. 

A escalada de casos da doença no Brasil fez com que a pasta já se refira à situação epidemiológica como um surto. No cenário global, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou a varíola dos macacos como emergência sanitária.

Em comunicado, no último sábado, o diretor da OMS, Tedros Adhanom, reconheceu os altos índices de transmissibilidade entre homens que fazem sexo com homens. E, ao mesmo passo em que pediu para que este grupo reduza as relações sexuais com múltiplos parceiros, também reforçou a necessidade de fugirmos de estigmas. 

O posicionamento de Tedros foi similar ao do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids), que publicou nota pedindo uma resposta global à varíola dos macacos, comparando-a com a Aids. “Baseando-se nas difíceis lições e aprendizagens da resposta à epidemia de Aids, ações eficazes de saúde pública devem ser orientadas pelos princípios de solidariedade, igualdade, não discriminação e inclusão”, diz a nota.